quinta-feira, 1 de dezembro de 2011

INSPEÇÃO EM 68 COMUNIDADES TERAPÊUTICAS - CFP

Na tarde da última segunda-feira (28), em Brasília, foi lançado o Relatório da 4ª Inspeção Nacional de Direitos Humanos: locais de internação para usuários de drogas, produzido pela Comissão Nacional de Direitos Humanos do Conselho Federal de Psicologia (CFP). O Relatório relata o resultado de vistorias realizadas em 68 instituições de internação para usuários de drogas, em 24 estados brasileiros, além do Distrito Federal. As vistorias foram realizadas nos dias 28 e 29 de setembro desse ano.
O Relatório faz parte da campanha do CFP de Direitos Humanos, intitulada “Em nome da proteção e do cuidado, que formas de sofrimento e exclusão temos produzido?”


Acesse Também:

Veja também o que saiu na mídia a respeito:

quarta-feira, 16 de novembro de 2011

sábado, 5 de novembro de 2011

Eu, o SUS, a ironia e o mau gosto

By Nina Crintzs
Há seis anos atrás eu tive uma dor no olho. Só que a dor no olho era, na verdade, no nervo ótico, que faz parte do sistema nervoso. O meu nervo ótico estava inflamado, e era uma inflamação característica de um processo desmielinizante. Mais tarde eu descobri que a mielina é uma camada de gordura que envolve as células nervosas e que é responsável por passar os estímulos elétricos de uma célula para a outra. Eu descobri também que esta inflamação era causada pelo meu próprio sistema imunológico que, inexplicavelmente, passou a identificar a mielina como um corpo estranho e começou a atacá-la. Em poucas palavras: eu descobri, em detalhes, como se dá uma doença-auto imune no sistema nervoso central. Esta, específica, chama-se Esclerose Múltipla. É o que eu tenho. Há seis anos.
Os médicos sabem tudo sobre o coração e quase nada sobre o cérebro – na minha humilde opinião. Ninguém sabe dizer porque a Esclerose Múltipla se manifesta. Não é uma doença genética. Não tem a ver com estilo de vida, hábitos, vícios. Sabe-se, por mera observação estatística, que mulheres jovens e caucasianas estão mais propensas a desenvolver a doença. Eu tinha 26 anos. Right on target.
Mil médicos diferentes passaram pela minha vida desde então. Uma via crucis de perguntas sem respostas. O plano de saúde, caro, pago religiosamente desde sempre, não cobria os especialistas mais especialistas que os outros. Fui em todos – TODOS – os neurologistas famosos – sim, porque tem disso, médico famoso – e, um por um, eles viam meus exames, confirmavam o diagnóstico, discutiam os mesmos tratamentos e confirmavam que cura, não tem. Minha mãe é uma heroína – mãos dadas comigo o tempo todo, segurando para não chorar. Ela mesma mais destruída do que eu. E os médicos famosos viam os resultados das ressonâncias magnéticas feitas com prata contra seus quadros de luz – mas não olhavam para mim. Alguns dos exames são medievais: agulhas espetadas pelo corpo, eletrodos no córtex cerebral, “estímulos” elétricos para ver se a partes do corpo respondem. Partes do corpo. Pastas e mais pastas sobre mesas com tampos de vidro. Colunas, crânio, córneas. Nos meus olhos, mesmo, ninguém olhava.
O diagnóstico de uma doença grave e incurável é um abismo no qual você é empurrado sem aviso. E sem pára-quedas. E se você ta esperando um “mas” aqui, sinto lhe informar, não tem. Não no meu caso. Não teve revelação divina. Não teve fé súbita em alguma coisa maior. Não teve uma compreensão mais apurada das dores do mundo. O que dá, assim, de cara, é raiva. Porque a vida já caminha na beirada do insuportável sem essa foice tão perto do pescoço. Porque já é suficientemente difícil estar vivo sem esta sentença se morte lenta e degradante. Dá vontade de acreditar em Deus, sim, mas só se for para encher Ele de porrada.
O problema é que uma raiva desse tamanho cansa, e o tempo passa. A minha doença não me define, porque eu não deixo. Ela gostaria muitíssimo de fazê-lo, mas eu não deixo. Fiz um combinado comigo mesma: essa merda vai ter 30% da atenção que ela demanda. Não mais do que isso. E segue o baile. Mas segue diferente, confesso. Segue com menos energia e mais remédios. Segue com dias bons e dias ruins – e inescapáveis internações hospitalares.
A neurologista que me acompanha foi escolhida a dedo: ela tem exatamente a minha idade, olha nos meus olhos durante as minhas consultas, só ri das minhas piadas boas e já me respondeu “eu não sei” mais de uma vez. Eu acho genial um médico que diz “eu não sei, vou pesquisar”. Eu não troco a minha neurologista por figurão nenhum.
O meu tratamento custaria algo em torno de R$12.000,00 por mês. Isso mesmo: 12 mil reais. “Custaria” porque eu recebo os remédios pelo SUS. Sabe o SUS?! O Sistema Único de Saúde? Aquele lugar nefasto para onde as pessoas econômica e socialmente privilegiadas estão fazendo piada e mandando o ex-presidente Lula ir se tratar do recém descoberto câncer? Pois é, o Brasil é o único país do mundo que distribui gratuitamente o tratamento que eu faço para Esclerose Múltipla. Atenção: o ÚNICO. Se isso implica em uma carga tributária pesada, eu pago o imposto. Eu e as outras 30.000 pessoas que tem o mesmo problema que eu. É pouca gente? Não vale a pena? Todos os remédios para doenças incuráveis no Brasil são distribuídos pelo SUS. E não, corrupção não é exclusividade do Brasil.
O maior especialista em Esclerose Múltipla do Brasil atende no HC, que é do SUS, num ambulatório especial para a doença. De graça, ou melhor, pago pelos impostos que a gente reclama em pagar. Uma vez a cada seis meses, eu me consulto com ele. É no HC que eu pego minhas receitas – para o tratamento propriamente dito e para os remédios que uso para lidar com os efeitos colaterais desse tratamento, que também me são entregues pelo SUS. O que me custaria fácil uns outros R$2.000,00.
Eu acredito em poucas coisas nessa vida. Tenho certeza de que o mundo não é justo, mas é irônico. E também sei que só o humor salva. Mas a única pessoa que pode fazer piada com a minha desgraça sou eu – e faço com regularidade. Afinal, uma doença auto-imune é o cúmulo da auto-sabotagem.
Mas attention shoppers: fazer piada com a tragédia alheia não é humor, é mau gosto. É, talvez, falha de caráter. E falar do que não se conhece é coisa de gente burra. Se você nunca pisou no SUS – se a TV Globo é a referência mais próxima que você tem da saúde pública nacional, talvez esse não seja exatamente o melhor assunto para o seu, digamos, “humor”.
Quem me conhece sabe que eu não voto – não voto nem justifico. Pago lá minha multa de três reais e tals depois de cada eleição porque me nego a ser obrigada a votar. O sistema público de saúde está longe de ser o ideal. E eu adoraria não saber tanto dele quanto sei. O mundo, meus amigos, é mesmo uma merda. Mas nós estamos todos juntos nele, não tem jeito. E é bom lembrar: a ironia é uma certeza. Não comemora a desgraça do amiguinho, não.


domingo, 18 de setembro de 2011

PRIVATIZAÇÃO DO SUS NO RIO DE JANEIRO


Na tarde do último dia 13, o plenário da ALERJ (Assembléia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro) aprovou por 50 votos favoráveis e 12 contra, o Projeto de Lei (PL) nº 767/2011, que entrega a gestão dos hospitais estaduais às chamadas “Organizações Sociais” (OS) – forma disfarçada de privatização. As representações de movimentos sindicais e sociais que lutam contra esse tipo de projeto que visa a privatização da saúde pública, vão denunciar todos os deputados que votaram a favor do Projeto. A denúncia será constante e feita especialmente nas bases eleitorais de cada um dos parlamentares que apoiaram a privatização da saúde no estado. Cartazes com nomes, fotos e afiliação partidárias serão produzidos e divulgados. Sob forte aparato policial da tropa de choque da PM, chamada pela presidência daquela casa para impedir que centenas de servidores, moradores de comunidades e usuários dos serviços públicos de saúde ocupassem as galerias da casa legislativa para protestar contra a privatização, esse foi um dos mais vergonhosos episódios protagonizados na ALERJ. Ainda assim, os manifestantes permaneceram do lado de fora, se pronunciando contra o que está sendo considerado um golpe tramado pela maioria dos deputados, em conluiu com o governador Sérgio Cabral (PMDB), autor do projeto.


Os links abaixo dão acesso à lista dos deputados que votaram a favor dessa investida criminosa contra o SUS e a população carioca e ao vídeo que mostra as manifestações contrárias ao projeto.


http://www.sidneyrezende.com/noticia/145439+lista+dos+deputados+que+participaram+da+votacao+das+oss
http://www.youtube.com/watch?v=ifmj4LN5lBg

sexta-feira, 1 de julho de 2011

O SUS À LUZ DOS MOVIMENTOS SOCIAIS




A discussão e posterior reforma da saúde como política de Estado está inserida em uma conjuntura marcada pelo regime militar, crise econômica e, finalmente, de abertura política. Nesse contexto, encontramos uma ampla mobilização da sociedade brasileira, que participou, por meio dos chamados movimentos sociais, do processo de transição à democracia. Esses movimentos tiveram papel crucial como atores sociais que fizeram pressão frente às dificuldades enfrentadas pela sociedade, particularmente no que diz respeito às políticas públicas. No contexto de luta pela redemocratização da sociedade, de modo geral, e das políticas públicas de modo específico, particularmente da política de saúde, a participação dos movimentos sociais parece ter sido crucial para a institucionalização do SUS, considerando-se todos os seus avanços e retrocessos ao longo desses 22 anos.
Em artigo intitulado “A constituição do SUS à luz dos movimentos sociais: a atualidade do movimento e o processo de participação e controle social na gestão do sistema”, e apresentado no II Encontro da Regional Norte-Nordeste da ABRAPSO, Santos e Schmitz (2011) discutem questões como: de que forma se configurou a participação do movimento social na construção do SUS? Como o movimento se apresenta na atualidade, na sua permanente consolidação, e considerando-se que já se conta com pouco mais de 20 anos de sua existência (com mecanismos institucionalizados - jurídico-administrativos - Leis nº 8.080/90 e nº 8.142/90 - que garantem a participação social na sua gestão? Tais mecanismos, institucionalizados juridicamente, permitiram a consolidação e o avanço do sistema, no que diz respeito à produção da política de saúde, na direção inicialmente pretendida?
A discussão em torno de questões como essas, em um contexto no qual a participação social tornou-se quase como uma panacéia das crises nas relações entre Estado e sociedade, são de fundamental importância para provocar um olhar crítico acerca das relações de poder construídas nesses espaços de suposta representatividade. Espaços dessa natureza deveriam tornar possível, lembrando Negri (2002), "inserir a produção do político na criação do social" 

A DESFAÇATEZ DO DISCURSO COLOCADA À PROVA

Em trabalho intitulado "Planejamento em Saúde: interação entre gestores e usuários no HPSM Mário Pinotti", Sousa (2011) desvela a desfaçatez do discurso dos gestores de saúde do Município de Belém, particularmente do prefeito e dos últimos e atual Secretários de Saúde do Município. Dentre outras coisas, a autora problematiza a gestão e o planejamento no HPSM, questionando "de que forma e em que medida as relações e interação entre Gestores e Usuários contribuem para a consolidação (ou não) de um planejamento no HPSM Mário Pinotti?". Em um trabalho realizado cuidadosamente, e que gerou resultados bastante interessantes de serem analisados e discutidos (como ela o fez), um chamou a minha atenção, particularmente por descortinar, volto a dizer, a desfaçatez do discurso propalado na mídia em geral, que aponta a suposta irresponsabilidade de gestores de saúde de outros municípios do Estado do Pará, que supostamente encaminham os usuários para esta capital, para além do que foi por eles pactuados. Isso, dizem eles, superlotaria o HPSM, impactando fortemente na qualidade da prestação do cuidado lá ofertado. Mas é preciso dizer que, se aqueles gestores municipais estão ou não encaminhando os usuários que estão sob sua responsabilidade de prestação do serviço para além do que foi pactuado entre este e os demais Municípios, essa é uma questão que merece ser verdadeiramente verificada. O fato é que Souza (2011) aponta, pasmem vocês, que 79,39% dos usuários atendidos no referido HPSM é da própria capital, Belém. E apenas 20,42%, provêm de outros municípios do interior do Estado. Isso é, portanto, bastante revelador das precárias condições de produção do cuidado que atualmente têm vigorado em Belém. É um reflexo da falta de compromisso desses gestores com a saúde pública e com o que preconiza as Leis nº 8.080/90 e nº 8.142/90, sem citar a CF de 1988.

quarta-feira, 25 de maio de 2011

NÃO À PRIVATIZAÇÃO DA SAÚDE EM LONDRINA

A saúde de Londrina tem muito a comemorar! Foi rechaçado no conselho municipal de saúde o projeto de Lei Orgânica para o município de Londrina proposto inicialmente pelo vereador Márcio Almeida do PSDB. Foram rejeitados todos os cinco projetos apresentados à câmara de vereadores que previam a privatização da saúde por intermédio de OSs e Fundações Estatais de Direito Privado.
A plenária ficou lotada. O movimento de saúde organizado da Zona Oeste de Londrina compareceu em massa; trabalhadores da maternidade também estiveram presentes e se fizeram ouvir. A rejeição aos projetos de lei privatistas, de OSs e Fundações Estatais de Direito Privado, que previam a entrega do patrimônio público, funcionários e capacidade instalada do estado para servir ao lucro de alguns empresários ou apadrinhados políticos foi derrubada pela organização da sociedade londrinense, que disse não à corrupção e à entrega do dinheiro público para quem está interessado em lucrar às custas do sofrimento da população.
Cartazes e faixas repudiaram as OSs, OSCIPs e Fundações Estatais de Direito Privado, os profissionais da maternidade também trouxeram as suas, exigindo a manutenção da maternidade como patrimônio de todos os londrinenses. A população se manifestou democraticamente e apoiou àqueles que votaram a favor da saúde pública, livre de terceirizações e privatizações.


http://forumpopularlnd.blogspot.com/2011/05/vitoria-da-organizacao-popular.html

sábado, 26 de março de 2011

Circo e Saúde Pública

Notícia veiculada no site da prefeitura (22/03/2011) de Belém, intitulada “Políticos paraenses unem forças por melhorias na saúde pública” (Por Gilson Farias), dá conta de que parlamentares paraenses se reuniram, na última segunda-feira (21) em um hotel na cidade para “unir forças políticas em torno de ações destinadas a melhorar a saúde pública em Belém e nos demais municípios do Pará. Tendo a Câmara Municipal de Belém como a proponente do encontro, decidiu-se pela realização de um seminário para discutir os problemas em torno da questão e procurar possíveis soluções.

A considerar pelos discursos proferidos, e falas ecoadas aos quatro cantos da reunião, parece que o bom-mocismo deu o tom ao evento, pois para o Presidente da Câmera Municipal, “precisamos discutir, debater e implementar as políticas públicas da saúde e o primeiro passo foi dado com o palanque desarmado”. A fala do prefeito (“Esse assunto tem que ser discutido sem paixão política. Caso contrário, estamos condenados ao fracasso. Acredito no bom senso e na sensibilidade daqueles que exercem o poder político”) também reflete essa velha cantinela, há muito presente na prática política de quem quer impressionar por seus discursos fugidios e conciliadores. Esquecem, no entanto, o real sentido da palavra, originalmente ligada à “Polis” e para onde suas práticas deveriam convergir, tendo clareza da necessária conflitualidade presente nessa convergência.

Mas, é “esperar” para ver a armação da lona do circo e a entrada em cena dos artistas circenses!!!


sábado, 5 de março de 2011

UM CARNAVAL DE SAÚDE A TODOS!!!

Arte: Fraga/México
Categoria: Prevenção

Todos os créditos para: http://www.aids.gov.br/node/45942

quinta-feira, 24 de fevereiro de 2011

O SUS é mais bem avaliado por quem o usa - Elio Gaspari

Importante para reflexão sobre a qualidade do SUS. É claro que, como nos diz Gastão Wagner, "há pedras no meio do caminho do SUS", e que precisamos "fazer uma 'meta-análise' que articule alhos com bugalhos", ele tem absoluta razão. Mas o que esperar, então, da população em geral quando o tema é SUS, e particularmente, a qualidade desse sistema!? 

O Ipea descobriu que 30,4% dos clientes do SUS estão satisfeitos e

80,7% louvam o programa Saúde da Família

Deve-se ao economista John Kenneth Galbraith a expressão "sabedoria convencional" para designar alguma coisa que as pessoas acham porque outras pessoas acham. Por exemplo: se a África está atolada em ladroeiras, golpes e miséria, como Botsuana está na África, Botsuana está ferrado. Erro, esse é um caso de ignorância convencional. Em 30 anos, o país cresceu a uma média superior à da China, Coréia ou EUA. Sua renda multiplicou-se 13 vezes e seus cidadãos tornaram-se mais ricos que os tailandeses, búlgaros ou peruanos. (Mais exemplos no livro "The Rational Optimist", de Matt Ridley, US$ 12,99 no e-book.)

Uma pesquisa do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada revelou que a percepção de que a rede de saúde pública brasileira é um desastre tem um perigoso ingrediente de ignorância convencional. O SUS não é nenhum Botsuana, mas 30,4% dos entrevistados que buscaram seus serviços ou acompanharam um familiar no último ano avaliaram-no, de uma maneira geral, como bom ou muito bom, enquanto 27,6% consideraram-no ruim ou muito ruim. O índice de aprovação do SUS fica na mesma faixa onde estão os serviços financeiros, aéreos e de telecomunicações.

Propagando a ignorância convencional, 34,3% dos entrevistados que não tiveram experiência alguma com o SUS acharam-no ruim ou muito ruim, e só 19,2% consideraram-no bom ou muito bom. A visão catastrofista está mais em quem não usa o serviço do que naqueles que o usam. Essa tendência já foi detectada há tempo e pesquisas do Ibope informam que ela ocorre também nas áreas de transporte e educação. Palpite: quem não usa um serviço que atende ao andar de baixo sente-se recompensado ao achar que ele não presta, pois custa-lhe dinheiro fugir da rede de atendimento da patuleia. Julga-se protegido, mesmo suspeitando que o plano de saúde poderá desová-lo na rede pública quando seu tratamento for mais caro. Esse pode ter sido o caso do cidadão que a seguradora Porto Seguro, amparada pela Agência Nacional de Saúde, remeteu ao SUS para receber (de graça) uma dispendiosa droga contra artrite reumatoide. Ele, que paga R$ 8.000 mensais no seu plano familiar, argumentou: "Eu não vou ficar em fila de SUS nem morto".


Avaliando cada ramo dos serviços utilizados, os números do Ipea dizem mais: 80,7% dos entrevistados atendidos pelo programa Saúde da Família consideram-no bom ou muito bom; 69,6% dos clientes do serviço de distribuição de remédios gratuitos deram a mesma boa opinião. A avaliação positiva do atendimento por médicos especialistas ficou em 60,6%. Na rabeira, com 48% e 45% de aprovação, estão as emergências e os postos de saúde, considerados ruins ou muito ruins por 31% dos entrevistados que os utilizaram.


Mesmo sabendo-se o risco que há em qualquer comparação de pesquisas, os números do Ipea colocam o SUS num patamar um pouco melhor que o do sistema público e privado americano (o que não chega a ser um elogio) e um pouco pior que o austríaco. Na Alemanha, 14% dos entrevistados acham que a área da saúde pública precisa ser completamente reconstruída, enquanto 38% acreditam que alguns ajustes seriam suficientes.


Se a freguesia do SUS botar a boca no mundo toda vez que for mal atendida, ele melhorará. Se baixar a cabeça, achando que "é assim mesmo", piorará. Em qualquer caso, não é justo que se tenha uma má opinião de um serviço público a partir do juízo de quem não o usa.

O Globo (13/02/2011)

terça-feira, 22 de fevereiro de 2011

DENÚNCIA AO MINISTRO: OSS E OSCIP EM NATAL

Vale a pena uma reflexão e discussão sobre os modelos de OSS e OSCIP na saúde pública. Qualquer semelhança, será mera coincidência!?
Ano passado eu já havia publicado (10 de outubro de 2010) algo que aconteceu de modo semelhante aqui em Belém.

Posted by saudeedilma on fevereiro 20, 2011
por Shirley Monteiro, Psicóloga e Bióloga da SESAP

Diante da angústia que a gestão de unidades de Saúde por Oscips - Os, vem causando em várias cidades do país, particularmente em Natal; publico o texto a seguir, divulgado no Coletivo Ampliado da Rede HumanizaSUS, que tem acompanhado a luta dos sanitaristas contra esta praga OSs, em Porto Alegre, Campinas, Curitiba, Natal, Cuiabá e tantos outros rincões do nosso País. Em Natal a Prefeitura realizou um contrato de 6 milhões de reais, por seis meses de gestão da UPA´Pajuçara, com uma Oscip pernambucana, deixando de convocar profissionais de saúde aprovados em Concurso municipal da SMS, deixando desabastecidas várias Unidades da ESF, sem medicamentos básicos, sem luvas, sem anticoncepcionais, sem medicação para hipertensos e diabéticos, sem agulhas descartáveis de insulina, unidades com estruturas deficitárias, enquanto realiza contratos de aluguéis de mansões do Alto da Candelária, e hotéis para sediar os órgãos públicos da Prefeitura. A estratégia é fazer parecer à população que somente as Unidades privatizadas podem prestar um bom atendimento; mesmo assim, alvo de reclamações constantes desta mesma população usuária, uma vez que a rede municipal em Natal não existe, concentrando-se somente a UPA com condições de atendimento. Por causa desta situação o PET- no Curso de Enfermagem na UFRN, está com seu Programa de Estágio prejudicado, uma vez que a SMS Natal não vem cumprindo a sua parte, mesmo tendo sido enviados os recursos do MS, referentes ao Convenio PET aprovado entre a UFRN, MS e SMS- Natal. O COREN, Ministério Público e demais entidades estão em luta cada vez mais intensa, diante desta situação. Comenta-se que representantes deste Movimento tentarão entregar um Relatório para o Ministro Padilha, em visita a Natal, hoje 19/02/2011. Seguem as ultimas notícias, publicadas na Rede Virtual Tecendo-Redes-PNH, E NOS JORNAIS LOCAIS EM 12/02/2011:

Coren denuncia caos nos postos
Publicação: 12 de Fevereiro de 2011 às 00:00

“A situação chegou a um ponto insustentável”, é o que dizem as enfermeiras das unidades de saúde de Natal. Em reunião na manhã de ontem, 11, o Conselho Regional de Enfermagem do Rio Grande do Norte (Coren/RN) convocou enfermeiros, técnicos em enfermagem e servidores da saúde para discutirem sobre os problemas que a categoria vem enfrentando e que foram, segundo eles, agravados durante a atual gestão. As unidades de saúde enfrentam diversos tipos de problemas, que vão desde ordens de despejo por não pagamento, falta de material, mofo e infiltração no teto até a presença de ratos e baratas nos locais.
Na reunião da manhã de ontem vários profissionais de diferentes unidades de saúde relataram problemas semelhantes e alguns até se emocionaram ao falar das atuais situações de trabalho as quais estão sendo submetidos. Jaqueline Abrantes, de 45 anos, é funcionária da Unidade de Saúde do Panatis. Ela contou que enfrenta os mesmos problemas das outras unidades de saúde da cidade com o agravante de ter uma demanda maior que a zona Sul, por exemplo. “Na nossa unidade falta papel toalha, seringas, luvas, gazes, máscaras, as coisas mais básicas. Nós estamos sujeitos a acidentes de trabalho como contaminações porque não temos luvas para usar”, contou. E a situação fica ainda pior.
De acordo com os enfermeiros só há determinados remédios em unidades que tem farmacêutico. As insulinas para diabetes até chegam aos postos, mas não há seringas nem agulhas. Os contraceptivos não chegam às unidades de saúde. Não há nem camisinhas nem anticoncepcionais.
O caso é tão grave e desmotivante que alguns profissionais chegam a ficar doentes diante da precariedade das condições de trabalho. Esse é o caso de Siluck Ribeiro, de 40 anos. Ela é a enfermeira chefe da Unidade de Saúde de Santa Catarina e há alguns meses vem sofrendo de síndrome do pânico e depressão. “Eu tirei férias por algum tempo, mas tive que voltar ao trabalho porque preciso de dinheiro. Todos nós temos contas a pagar”, desabafou.
Siluck contou que em sua unidade os profissionais querem trabalhar, mas diante da falta de material isso é impossível. “O posto conta com profissionais responsáveis e competentes, que querem trabalhar e não podem porque não têm as condições necessárias. Ano passado parte do teto da sala do dentista desabou e o resto ia desabar esse ano se o próprio médico não tivesse ‘dado um jeito’ no gesso com uma furadeira”, relatou.
De acordo com o depoimento dos enfermeiros no primeiro momento da reunião com o Coren, a situação da saúde nunca pode ser considerada boa, mas desde que a nova gestão assumiu  todos os problemas foram agravados. “Nunca vi uma gestão igual a essa”, falou a enfermeira chefe da unidade de Santa Catarina.
Quem também está muito preocupada com a situação das unidades de saúde de Natal é Rosana Alves, coordenadora do Estágio na Atenção Básica do Curso de Enfermagem da Universidade Federal do RN. Os alunos da UFRN fazem estágio nessas unidades e segundo a coordenadora essa situação compromete a capacitação deles. “A UFRN está muito preocupada com a situação do serviço público de saúde em nossa cidade”.


Secretário garante a compra de material


O secretário de Saúde de Natal, Thiago Trindade, afirmou que o município vai começar a compra dos materiais e medicamentos que estão em falta, itens mais simples, como gazes, já estarão disponíveis nas Unidades de Saúde de Natal ao longo da semana. “Nós vamos adquirir os materiais através de um processo chamado registro de preço, o que possibilita mais rapidez no processo. Essas medidas são a curto e médio prazo. A longo prazo, mas ainda para esse semestre, colocaremos em prática um sistema integrado que vai monitorar desde a compra até a distribuição do material. Com essas medidas, o problema de abastecimento de medicamentos de Natal deve estar totalmente sanado até junho deste ano. Prazo determinado pela prefeita”, disse Thiago Trindade.
De acordo com informações da ação civil, estavam em falta os seguintes medicamentos: Ácido Acetilsalicílico 100mg, Cefalexina 250 e 500mg, Diazepam 10 mg e 5mg (comprimido e ampola) e todos os itens do programa HIPERDIA, que atende pacientes com diabetes e hipertensão.
Ainda segundo o secretário, essas medidas já vinham sendo tomadas antes da ação civil pública, ajuizada na semana passada pela Promotoria da Saúde. “Estamos trabalhando há um tempo nisso. E posso garantir que a situação não é essa que dizem, que estamos à beira do caos. Com essas medidas, vamos regularizar a situação”, disse Thiago Trindade.
Questionado sobre a aquisição, por parte do município, de equipamento para o sistema de ponto eletrônico, o secretário disse que a compra está sendo feita pela Secretaria de Administração. “Essa verba é da Secretaria de Administração e não pode ser utilizada pela SMS ou por qualquer outra pasta, pois é uma fonte específica. Não há possibilidade de transferência de fonte. Além disso, nossos recursos para compra de medicamentos são de mais de R$20 milhões, uma quantia considerável. O problema era a gestão”, disse Trindade.
Outro problema que será resolvido com integração do sistema de medicamentos é a questão do desvio de medicamentos. Hoje a SMS não tem como controlar a quantidade de material que é entregue e de que forma ele é distribuído pelas unidades de saúde. E com esse novo sistema haverá todo o controle.

Jornal de hoje
Ontem, dia 12 de fevereiro, aconteceu uma reunião no auditório Raimunda Germano – departamento de enfermagem da UFRN, onde se discutiu o atual cenário de precariedades e caos em que se encontram as unidades de saúde do município. Estavam presentes  professores, representantes do COREN, sindicato dos enfermeiros, técnicos em enfermagem e enfermeiros de todos os distritos. Tentarei fazer um breve relato/síntese das condições de trabalho a partir das falas dos profissionais que lá se pronunciaram apresentando os pontos comuns e as especificidades que consegui registrar:
Pontos comuns:
- Falta de recursos humanos; equipes incompletas; falta de médicos; na unidade de Ponta Negra há apenas um técnico de enfermagem para responder por todo o trabalho de enfermagem.
- Falta de manutenção dos equipamentos. Na US Guarita não tem tensiômetro. Os usuários são atendidos sem verificação de pressão arterial.
- Ausência de um sistema de abastecimento de insumos/medicamentos/materiais das unidades. Faltam gazes, medicamentos anti-hipertensivos, hipoglicemiantes, luvas, máscaras, água, papel-toalha, métodos anticonceptivos (em algumas unidades, a falta dos métodos ocorre há cinco meses), papel higiênico, detergentes.
- Falta de acesso a exames laboratoriais
- Nenhuma das unidades presentes tem internet funcionando, fato que impossibilita a marcação das referências.
- Estruturas físicas inadequadas.

Especificidades:
. Nova Natal II - há um processo de despejo. A água da pia onde se lava as mãos retorna pelo esgoto inundando a sala; lagartixas mortas foram encontradas  dentro da caixa dágua que abastece a unidade.
. Soledade II - Em reforma desde agosto de 2010. Os profissionais atendem em meio à tinta, poeira e barulho.
. Nova Natal I – A unidade foi interditada e os profissionais “remanejados” para atendimento em um ônibus.
. Santa Catarina: O teto está desabando, a sala de expurgo invadida por mofo e ratos. Acúmulo de lixo em torno da unidade.
. Santarém: formigueiros invadem as estruturas das paredes; foram encontradas duas cobras na unidade. Falta material para coleta de exames das gestantes.
. Soledade I - estrutura física inadequada, observa-se presença de baratas e escorpiões.
. Sede do D. Leste - foi interditada. As unidades estão sem comunicação com a sede do Distrito.
. Ponta Negra: Há apenas um técnico de enfermagem.
. Nova Descoberta: esterilização deficiente; não há separação entre expurgo e preparo; falta balde com tampa. A unidade esteriliza todo o material do Distrito Sul.
Acrescenta-se aos relatos, a falta de segurança nas unidades, violências sofridas, pressões dos gestores para manter atendimentos e procedimentos sem as menores condições com consequente adoecimento do trabalhador.

Encaminhamentos:
. Elaboração de um documento/relatório que será encaminhado à prefeita, ao secretário municipal, ao ministério público e do trabalho, ao CMS e CES e ao reitor da UFRN
. Divulgação da situação nos meios de comunicação;
. Construção de uma agenda de resistência da enfermagem;
. Visitas às unidades em parceria com sindicatos, conselhos municipal e estadual e das diversas categorias, covisa, ministério público;
. Buscar parcerias com o PET e pro-saúde considerando que as unidades são campos de estágio/formação de profissionais.
. Utilizar o grupo virtual tecendo redes para divulgação das agendas e discussões;
. Incluir no grupo virtual os profissionais de enfermagem que estiveram presentes na reunião.



terça-feira, 1 de fevereiro de 2011

Oi Guilherme, acho muito oportuno você publicar essa matéria. É um aspecto a considerar na condição quase caótica de muitos serviços de saúde pública. Não isenta os governos de agirem nesse sentido. Soube há pouco de um sistema de assistência a doentes que vêm do interior para a capital, que podem se inscrever para receber recursos para os deslocamentos que precisam fazer para cuidar da saúde em Belém. Mais interessante, é que cobre despesas de acompanhante. Esperemos que esse mecanismo se amplie. Abraços. Cristina

Por http://sociologando-on-line.blogspot.com/em CAPITAL SOCIAL E ACESO À SAÚDE PÚBLICA em 31/01/11

TFD - Tratamento Fora de Domicílio


Tens razão Cristina,


Existem muitos mecanismos já instituídos pelas Leis nº 8.080/90 (dispõe sobre as condições para a promoção, proteção e recuperação da saúde, a organização e o funcionamento dos serviços correspondentes e dá outras providências) e nº 8.142/90 (dispõe sobre a participação da comunidade na gestão do SUS e sobre as transferências intergovernamentais de recursos financeiros na área da saúde e dá outras providências), e demais instrumentos jurídicos-normativos, dentre eles as chamadas Normas Operacionais Básicas da Saúde (NOBs), e mais recentemente, o Pacto pela Saúde, em 2006. É importante que se diga que as NOBs definem as competências e responsabilidades de cada esfera de governo e estabelece as necessárias condições para que estados e municípios assumam novos posicionamentos frente aos desafios de implantação e consolidação do SUS. É ai que está o que você comenta acerca da oferta do sistema de assistência para pacientes que vêm do interior.

Esse mecanismo foi instituído pela Portaria nº 55 da Secretaria de Assistência à Saúde (Ministério da Saúde) e é chamado TFD (Tratamento Fora de Domicílio). Tem como objetivo maior, proporcionar tratamento médico, por meio do SUS, a pacientes portadores de doenças não tratáveis em seu município de origem, por falta de condições técnicas. Trata-se de uma ajuda de custo para o paciente e, em alguns casos para seu acompanhante (constante no Art. 11 da Portaria SAS nº 55/1999) cujos valores são irrisórios e que muitas vezes ainda há necessidade de o paciente recorrer à justiça para consegui-lo.

Aplica-se aos casos em que o paciente foi encaminhado, por ordem médica, à unidades de saúde localizada fora do município e/ou estado em que reside, quando foram esgotadas todas as possibilidades de tratamento em seu local de origem. Também há necessidade de haver um prognóstico de cura total ou parcial e que requeiram procedimentos de alta e média complexidade eletiva.

O programa prevê a oferta de uma série de benefícios, desde passagens (aérea, terrestre ou fluvial) de ida e volta (para o paciente e seu acompanhante, quando for o caso); consulta, tratamento ambulatorial, hospitalar/cirúrgico previamente agendado; e ajuda de custo para alimentação e hospedagem do paciente e/ou acompanhante enquanto durar o tratamento. Para tanto, é necessária uma série de documentos (laudo médico – próprio do TFD – e emitido pelo médico do município de origem do paciente; cópia de documentos do paciente e/ou acompanhante; cópia de exames necessários; etc.).

O custeio é de responsabilidade das Secretarias Municipais de Saúde, desde que o deslocamento seja realizado a partir de um município habilitado em Gestão Plena do Sistema Municipal (GPSM). Quando o município está habilitado apenas na Gestão Plena da Atenção Básica (GPAB) essa responsabilidade recai sobre a Regional de Proteção Social/SESPA a qual o município está atrelado. Por outro lado, quando o deslocamento é interestadual, essa responsabilidade passa a ser da Secretaria de Estado da Saúde. Em todos os casos, a autorização deverá ser feitas de acordo com a disponibilidade orçamentária do Município ou do Estado.

Como a gente pode ver, o fluxo parece estar bem traçado no papel, mas na prática ele nem sempre é viável... isso ocorre em função de vários fatores, como por exemplo, o processo de descentralização do sistema. Se ele se configurou como um dos grandes sucessos do SUS (já que passou-se a uma co-responsabilidade entre as três esferas de governo), também foi, ou ainda tem sido, uma das “pedras” em seu caminho, pois houve a necessidade de dotar estados e municípios, particularmente esses últimos, de maior resolutividade, o suficiente para fazer frente às demandas de saúde da população. Basta pensarmos nas características geográficas heterogêneas de todo o país, diante das diferentes capacidades financeira, administrativa e operacional, de estados e municípios, além das diversas disposições políticas de governadores e prefeitos, para darem conta daquela tarefa...

 “Radical defesa da vida como princípio
norteador da atuação em saúde!!!”

quinta-feira, 27 de janeiro de 2011

CAPITAL SOCIAL E ACESSO À SAÚDE PÚBLICA

Figura extraída do endereço: http://www.treebranding.com/blog/?p=1553

Revisitando a carta escrita por Lígia Bahia, e aqui transcrita (13/01/2011), diversos aspectos me chamaram a atenção. Dentre eles, aquilo que a autora fala sobre “as batalhas para conseguir atendimento na rede pública”, citando como uma das estratégias para isso, o contato essencial com alguém ‘de dentro’. Fazer contato com alguém “de dentro” ou “de fora”, é esse o aspecto que discuto, junto com Maneschy & Alberto, em artigo intitulado Capital social e acesso à saúde pública: uma proposta de análise de redes sociais informais de usuários do Sistema Único de Saúde (SUS), publicado (versão completa) nos Anais do II Encontro da Sociedade Brasileira de Sociologia da Região Norte (2010) - http://www.sbsnorte2010.ufpa.br/site/anais/html/gt4.html (GT -04)






Partimos de algumas formulações acerca do conceito de capital social, presentes na literatura sociológica, para considerar a possibilidade de redes sociais informais, estabelecidas entre usuários do SUS, permitirem que parcela significativa da população que dele depende, tenha acesso aos serviços públicos de saúde ofertados na rede e, nesse sentido, sua importância quanto à universalização do sistema. Além disso, consideramos o pressuposto de que as interações sociais entre os indivíduos possam resultar em ações cooperativas que influam no acesso que eles têm aos cuidados de saúde. Assim, não se pode atribuir tal acesso apenas à sua capacidade de absorção, própria dos mecanismos instituídos pelos agentes que pensam a gestão do sistema. Essa pressuposição está relacionada à originalidade e ao poder heurístico em que a noção de capital social está assentada, ou seja, nas consequências positivas da sociabilidade, e na possibilidade dessa última ser fonte privilegiada de poder e influência, assim como de acesso a bens e serviços aos quais comumente os participantes não teriam acesso, não fosse a ativação de suas redes de relações sociais. Afinal, como afirmam Fleury, Coelho e Pache (2007), embora o total de investimento em saúde (SUS e saúde suplementar) no Brasil não seja tão diminuto como se costuma pensar, ainda “estamos produzindo uma desigualdade brutal no acesso a serviços” (p. 310). E prosseguem: “Não conseguimos, até aqui, sequer fazer com que esta desigualdade resulte em algum benefício para os menos favorecidos usuários do SUS”. Para nós, as interações sociais entre os usuários os têm levado, por meio de ações cooperativas, ao acesso desejado. Por isso, defendemos que a capacidade resolutiva dos problemas, centrada nos mecanismos instituídos pelos agentes que pensam a sua gestão, é reduzida.


Para grande parte da população, a falta de acesso às políticas públicas de modo geral, e aos cuidados de saúde em particular, ainda parece ser vista por um prisma naturalizador, reforçado por uma tradição de precariedade no usufruto de direitos sociais. Muitas vezes vê-se a prestação de serviços dessa natureza como um favor prestado, principalmente àqueles que não têm recursos financeiros para aceder aos cuidados de saúde. Para essas pessoas, parece não haver a convicção de que se trata de uma garantia constitucional (PORTUGUAL, 2005). “As expectativas de obter uma boa assistência no sistema público são extremamente reduzidas, sendo sustentadas pela ideia de que ‘não se paga, é-se mal servido‘” (p. 9).


Ao final, apontamos a necessidade de que as ações institucionais também estejam voltadas aos mecanismos informais empregados pela população em sua busca de acesso aos cuidados em saúde.

quinta-feira, 13 de janeiro de 2011

O BAZAR DA SAÚDE PÚBLICA

Ligia Bahia



Comentários sobre as batalhas para conseguir atendimento na rede pública e marcar consultas via planos de saúde viraram arroz de festa. Raras são as reuniões familiares ou encontros entre amigos que deixem de reservar tempo para indexar novos capítulos aos manuais de sobrevivência. Prevê-se que em 2011 as melhores armaduras serão inteiramente revestidas de meias-verdades.  Para marcar a consulta num prazo razoável deve-se anunciar como cliente particular e na hora de acertar o pagamento apresentar a carteirinha do plano. Em relação a muitos serviços públicos além do imprescindível contato com alguém “de dentro” recomenda-se adicionalmente referir uma ou mais doenças bem compatíveis com as especialidades do estabelecimento. No entanto, as identidades positivas de rico, capazes de bancar o tratamento, ou negativas, forjadas na afirmação de uma cidadania biológica, saturada por preconceitos historicamente acumulados, servem apenas para furar barreiras de acesso. Não é usual que a desconfiança acerca das instituições de saúde se  estenda aos médicos. Pagamento injusto para quem muito estudou, instalações físicas precárias e os aviltantes valores de remuneração dos planos privados atraem solidariedade. Só para lembrar: o baixo índice de confiança no sistema público de saúde decresceu de 49 para 47 entre 2009 e 2010, enquanto 70% dos brasileiros declararam, no ano passado, confiar nos médicos que os atenderam.
Às voltas com os desfalques nas equipes de emergência, em UPAs e Unidades de Saúde da Família e pressões e greves de especialistas, os órgãos responsáveis buscam explicar e suprir a falta de médicos. Mas até agora não conseguimos nos desvencilhar da polêmica sobre se temos escassez ou excesso de médicos mal formados. As propostas se alternam. Ora se enfatiza a criação de novos cursos, melhor aproveitamento de recém-formados por meio da instituição do serviço civil obrigatório, mudanças para a residência e regras mais flexíveis para o trabalho de médicos estrangeiros ou brasileiros formados em outros países, ora sugere-se a intervenção na formação e performance dos médicos por meio de exames sistemáticos.
Todos têm razão. Em 2007, considerando o tamanho de cada população, o Brasil formou menos médicos (5,4 por 100.000 habitantes) do que os EUA (6,3) e Reino Unido (9,2). Por isso, em 2008, o indicador brasileiro de 1,73 médicos por 1.000 habitantes foi inferior ao de ambos os países mencionados (2,43 e 2,61 respectivamente). E não dá ignorar as evidências sobre as deficiências nos cursos médicos. No último exame realizado para recém-graduados em São Paulo, houve muitos erros nas respostas relativas ao diagnóstico e tratamento de sífilis, hanseníase e tuberculose.
Mas, para não rezar a missa pela metade, é preciso se levar em conta circunstâncias pouco decantadas. A maioria dos médicos trabalha no SUS e simultaneamente em consultório particular. O quanto de dedicação ao público e ao privado varia. A carga horária dedicada às instituições governamentais era mais condizente com as assimetrias de renda da população. Não ocorreu qualquer êxodo - trabalhar no público e no privado é regra – mas a repartição do tempo mudou. Junto com a privatização vieram instabilidade, jornadas de trabalho prolongadas, perda de autonomia e a ascensão de diversas modalidades de empreendimentos médicos, sempre localizados nas regiões mais desenvolvidas,  e as cobranças por fora.
Atualmente, inúmeros médicos são na prática empresários de si mesmo: os denominados PJs (pessoas jurídicas), tratando-se mais de uma forma de contratação, dotada de vantagens fiscais, do que empresariamento. Outros tantos, no rastro da expansão dos empreendimentos diagnósticos e terapêuticos, tornaram-se proprietários. O terceiro grupo de controladores de ações de empresas setoriais de grande porte é ultra-seleto. Poucos são efetivamente donos do bazar. O efeito mais disseminado da privatização é o autoreferenciamento – consiste na indicação de procedimentos e medicamentos que remuneram de variadas formas quem os solicitam. As meritórias iniciativas do Conselho Federal de Medicina para coibir as relações entre médicos e fabricantes e distribuidores de insumos, isoladas, se mostraram insuficientes para desequilibrar a balança para o lado do oficio.
Portanto, o inflacionamento dos atuais postos de trabalho sem mudanças nas regras que regem as responsabilidades institucionais poderá até ser útil para os contratantes de médicos. Mas, a tendência de ampliação de oferta e redução do preço da remuneração dos médicos não gerará mais acesso e qualidade da atenção para os usuários. Para deslocar a discussão da mera falta ou sobra é preciso desvelar outras engrenagens do trabalho médico. Não podemos nos dar ao luxo de substituir a realidade por exercícios de coerência formal que enfeitam promessas evasivas. O fato de os médicos brasileiros serem empregados de muitos patrões e a corrida em direção aos maiores valores de remuneração custa muito caro à sociedade. Se homens e mulheres são iguais entre si, apesar das diferenças, um sistema propositalmente descoordenado, movido por interesses nem sempre condizentes com as necessidades de saúde alonga a estratificação social. Futuros imaginados com base na supressão e não na elaboração e enfrentamento das contradições poderão eternizar a  briga estéril sobre o que mais falta: dinheiro, médicos ou gestão.

Ligia Bahia, vice-presidente da ABRASCO e professora de economia da saúde no Instituto de Estudos em Saúde Coletiva da Universidade Federal do Rio de Janeiro (IESC/UFRJ). Artigo publicado no Jornal O Globo, em 10/01/2011.