sexta-feira, 1 de julho de 2011

O SUS À LUZ DOS MOVIMENTOS SOCIAIS




A discussão e posterior reforma da saúde como política de Estado está inserida em uma conjuntura marcada pelo regime militar, crise econômica e, finalmente, de abertura política. Nesse contexto, encontramos uma ampla mobilização da sociedade brasileira, que participou, por meio dos chamados movimentos sociais, do processo de transição à democracia. Esses movimentos tiveram papel crucial como atores sociais que fizeram pressão frente às dificuldades enfrentadas pela sociedade, particularmente no que diz respeito às políticas públicas. No contexto de luta pela redemocratização da sociedade, de modo geral, e das políticas públicas de modo específico, particularmente da política de saúde, a participação dos movimentos sociais parece ter sido crucial para a institucionalização do SUS, considerando-se todos os seus avanços e retrocessos ao longo desses 22 anos.
Em artigo intitulado “A constituição do SUS à luz dos movimentos sociais: a atualidade do movimento e o processo de participação e controle social na gestão do sistema”, e apresentado no II Encontro da Regional Norte-Nordeste da ABRAPSO, Santos e Schmitz (2011) discutem questões como: de que forma se configurou a participação do movimento social na construção do SUS? Como o movimento se apresenta na atualidade, na sua permanente consolidação, e considerando-se que já se conta com pouco mais de 20 anos de sua existência (com mecanismos institucionalizados - jurídico-administrativos - Leis nº 8.080/90 e nº 8.142/90 - que garantem a participação social na sua gestão? Tais mecanismos, institucionalizados juridicamente, permitiram a consolidação e o avanço do sistema, no que diz respeito à produção da política de saúde, na direção inicialmente pretendida?
A discussão em torno de questões como essas, em um contexto no qual a participação social tornou-se quase como uma panacéia das crises nas relações entre Estado e sociedade, são de fundamental importância para provocar um olhar crítico acerca das relações de poder construídas nesses espaços de suposta representatividade. Espaços dessa natureza deveriam tornar possível, lembrando Negri (2002), "inserir a produção do político na criação do social" 

A DESFAÇATEZ DO DISCURSO COLOCADA À PROVA

Em trabalho intitulado "Planejamento em Saúde: interação entre gestores e usuários no HPSM Mário Pinotti", Sousa (2011) desvela a desfaçatez do discurso dos gestores de saúde do Município de Belém, particularmente do prefeito e dos últimos e atual Secretários de Saúde do Município. Dentre outras coisas, a autora problematiza a gestão e o planejamento no HPSM, questionando "de que forma e em que medida as relações e interação entre Gestores e Usuários contribuem para a consolidação (ou não) de um planejamento no HPSM Mário Pinotti?". Em um trabalho realizado cuidadosamente, e que gerou resultados bastante interessantes de serem analisados e discutidos (como ela o fez), um chamou a minha atenção, particularmente por descortinar, volto a dizer, a desfaçatez do discurso propalado na mídia em geral, que aponta a suposta irresponsabilidade de gestores de saúde de outros municípios do Estado do Pará, que supostamente encaminham os usuários para esta capital, para além do que foi por eles pactuados. Isso, dizem eles, superlotaria o HPSM, impactando fortemente na qualidade da prestação do cuidado lá ofertado. Mas é preciso dizer que, se aqueles gestores municipais estão ou não encaminhando os usuários que estão sob sua responsabilidade de prestação do serviço para além do que foi pactuado entre este e os demais Municípios, essa é uma questão que merece ser verdadeiramente verificada. O fato é que Souza (2011) aponta, pasmem vocês, que 79,39% dos usuários atendidos no referido HPSM é da própria capital, Belém. E apenas 20,42%, provêm de outros municípios do interior do Estado. Isso é, portanto, bastante revelador das precárias condições de produção do cuidado que atualmente têm vigorado em Belém. É um reflexo da falta de compromisso desses gestores com a saúde pública e com o que preconiza as Leis nº 8.080/90 e nº 8.142/90, sem citar a CF de 1988.